domingo, 15 de maio de 2011

Letras

É melhor irmos nos acostumando - escreveu ela. Enquanto a manhã não chega, o que nos resta é frio. O frio e o silêncio.
Noite; apenas mais uma que se vai.
Era inverno, e a única coisa que precisávamos era uma boa companhia para aquecer nossos pés que, mesmo embaixo das cobertas, continuavam frios. Não precisávamos de outros cigarros, de diferentes bebidas ou de mais drogas, nós só precisávamos de um pouco mais de amor.
Amor, carinho e atenção. Alguém com os pés quentinhos para ficarem juntos dos nossos, ou até pés frios para fazerem companhia para eles. Só.
Era tudo tão simples, mas tão difícil de se encontrar por aí. Era somente amor. Esse tal que todos tem medo, todos correm, negam quando sentem, dizem que não existe, esse mesmo que todos querem sentir, mas não se permitem.
Tudo isso é medo? Ou somente falta de coragem para confiar em alguém além de nós mesmos? Esse bloqueio todo, afastando qualquer um de nos encostar, de nos conhecer melhor, de nos amar. A culpa é inteiramente nossa! Que bobagem é essa agora? E toda aquela compaixão que compartilhávamos uma vez?

(Tomou mais um gole de sua bebida doce, para contrastar com seu humor ácido, e continuou a escrever, mesmo sabendo que ninguém prestaria atenção no que escrevera. Ela morava no Sul do país, e naquela noite fazia muito frio naquela cidadezinha, por isso resolvera ficar em casa, somente com sua bebida e um filme qualquer que passara na televisão. Havia recusado todos os convites para sair, parecia que algo à segurava em casa aquela noite. Preferia olhar somente a noite escura e fria pela janela do quarto, do que sair e ter de olhar para corpos sem alma e sem amor algum. Apenas almas perdidas; a dela seria apenas mais uma, no meio de uma multidão.
Continuou escrevendo, então.)

Eu entendo que tenham te machucado e tudo mais, me machucaram também. Mas nem por isso deixei de acreditar no amor. Acredito, e muito. Creio e tenho fé de que um dia ainda encontrarei o meu. Um meu, inteirinho e perfeito, só para mim. Acho que é isso que lhes falta, sabe, um pouco de Deus, um pouco de fé em algo ou alguém maior, que melhore as coisas de um dia para o outro, entendem?
Deus, eu não quero ser Você, juro! Só quero tentar pôr mais amor nesses coraçõezinhos solitários e congelados. Não vamos viver para sempre e quero apenas que as pessoas se tornem mais felizes e amorosas lendo o que eu escrevo. Não vamos viver para sempre e o que eu quero é amar e viver por alguém. Viver. Morrer.
Porque no final de tudo, não há outra saída: a gente vira apenas fumaça. Vai voado, se juntando com o ar e sumindo, sumindo e sumindo até não sermos mais vistos. Todos nós. Todos iguais.
Vai amar, vai. Só pra terminar como uma fumaça mais bonita, feliz.
E menos fria.

(Percebeu que já era tarde, e parou por ali. Aquele texto pudera não fazer sentido para muita gente, muita gente podia não lê-lo, e ela sabia que a maioria não gostaria dele, muito menos dela, mas ela estava feliz. Por que naquela noite, ela se sentiu não se sentiu sozinha. Mesmo com os pés gelados e sozinhos embaixo do cobertor, e sem amor nenhum dentro do coração. Ela teve uma companhia: as letras. Seu mais novo amor.
Botou o ponto final, e foi dormir. Naquela noite fria: sorrindo.)

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